quinta-feira, 22 de maio de 2008

A rapariga da camisola lilás

A rapariga da camisola lilás chora.
Chora sem lágrimas.
chora por dentro,
como se o rio que cava sulcos na terra
explodisse dentro dela,
com a força de quem esteve preso mil anos.
Consigo ver, dentro dela, as vagas que recebem este filho perdido,
e as flores que ela deixou morrer
em momentos de terna loucura.
Consigo ver como os punhais a atravessam
e como ela sangra...

A rapariga da camisola lilás grita.
Grita sem se ouvir.
Grita com os gestos que a vestem de negro,
com os olhos enlutados, marca brutal
de uma guerra travada à flor da pele,
sem tréguas,
sem quartel,
sem vencedores.
Ela não tem nada do que um dia ousou viver.

A rapariga da camisola lilás desespera.
E está só.
Repousa no escuro, no fundo do mar,
onde se deixa enredar
por paredes de silêncio azul e castelos
de papel de cartas de amor,
enrugadas e amareladas, tristes como ela...
E enquanto a poeira dos dias vai assentando sobre a arca dos sonhos
ela vai-se deixando cair por entre as flores murchas
e as estrelas que se apagam...

A rapariga da camisola lilás morre.
Não morre, vai morrendo,
no embalar do movimento da terra
com as marcas de silêncio que lhe demos, palhaços inconscientes.
Ela morre,
e nós morremos um pouco com ela.

4 comentários:

meldevespas disse...

Olha Mad...como dizia o outro, este poema está "perfeito perfeito!"
Amei!
Beijo

weee disse...

E sabes o que é mais "perfeito perfeito"?

É que enquanto lia senti que alguém estava a descrever os meus "sonhos maus"... de uma maneira belíssima!

Pi disse...

A D O R E I...

Gostei mesmo muito deste texto... tocante..

E quantas raparigas de camisolas lilás não andam por aí... :)

telma disse...

ir morrendo deve de ser das piores coisas |:
oh mad, isto está tao bonito que nem sei o que dizer*